sexta-feira, 17 de junho de 2016

“Olhares tristes e sofridos”

A sociedade Cabo-verdiana presencia, diariamente, situações tristes capazes de tirar as lágrimas dos olhos dos mais sensíveis. São vários pontos da capital onde o clima e a circulação massiva oferecem um ganha-pão para aqueles que aparentam ser incapazes de se auto-sustentarem. Entre olhares tristes, semblantes descaídos e pés descalços, há sempre um ser inocente de aspecto inofensivo a tentar cativar o coração de quem quer de, alguma forma, alterar a rotina dessas pobres criaturas. As roupas rasgadas e maltratadas pelo tempo descartam hipóteses de perceber a verdadeira cor do sofrido vestuário. Trocam lares pela porta dos bares em busca de trocados para finalizar o dia com sorrisos
molhados.

  Quando a casa já não pode erguer a panela ao fogão, são os menores que arriscam as pena mergulhando na aventura das esquinas a erguer um silencioso clamor pelas veredas da capital. De mão em mão, ruas e becos, portas e lojas, o discurso não muda: “Dê-me 10 escudos”. Este é o pedido inicial. A expetativa é conseguir mais do que isso. São crianças que fazem da rua as suas casas e vivem em situação de riscos e sem proteção. Seres inocentes que possuem laços familiares, apesar de apresentarem uma aparência de abandono.

Usam o espaço da rua apenas para como lugar de lazer e trabalho, visando obter sustento e auxilio para os familiares e retornam diariamente para a casa. E assim se repete o triste cenário das crianças na rua em vários pontos da capital. Tivemos uma entrevista com quatro crianças e adolescentes entre os nove aos 17 anos do sexo masculino que exemplifica essa realidade. Todos foram entrevistados durante o período de trabalho, na zona de Palmarejo, onde procuravam clientes para obter o dinheiro do dia. Walter, rapaz de 12 anos de idade, prefere reduzir as despesas da casa ao mergulhar-se nas aventuras das esquinas. " lá em casa é muito difícil tenho nove irmãos aiNda tem minha mãe e minha avo... a comida não chega para toda gente , mas aqui na rua posso comer e brincar... Costumo faturar de 20 à 1000 mil escudos por dia tenho alguns amigos aqui, pessoas conhecidas que costumam me trazer comida e algumas comprinhas", diz o rapaz. A socialização dessas crianças ocorrem pela dinâmica da rua, viver ali representa seu desenvolvimento. Para os miúdos, estar longe da casa muitas vezes não é resposta da vontade própria mas sim obrigação de quem detêm a guarda dos pobres inocentes. Há casos em que os meninos são explorados e privados de fazer o que mais gostam. Falo do rapaz de 11 anos que decidimos chamar-lhe de “Carlitos”. Ao perguntar-lhe se gostaria de estar neste lugar, o menino responde: "minha família é muito pobre mas eu não gostaria de estar aqui prefiro estar na escola... Mas meu irmão me obriga a trabalhar para levar o dinheiro para casa".

Cabo Verde é um País onde o ensino tornou-se num pilar fundamental para o futuro dos mais pequenos pelo fato de não houver alternativas a não ser os estudos. Nesta perspectiva, o Sociólogo remata que a redução das crianças nas escolas passa a ser uma das graves consequências deste fenómeno. Jairson Gomes acrescenta ainda que ficam sem nenhum plano ou projeto digno e não têm futuro. O abandono escolar é uma realidade que passou a fazer parte da vida de David. O rapaz deixou os estudos aos 10 anos: "Eu estudava quarta classe mas parei não tenho condições, muitas vezes ia para escola com fome, não tinha materiais escolares não tinha sapatos por isso deixei de estudar" lamenta a criança. A ausência dos miúdos do seio familiar e escolar permite que estes passem maior parte do seu tempo nas ruas. Ali estão expostos à situação de riscos eminentes. Para o sociólogo, as crianças estão sujeitas a vários riscos, tais como: prostituição, tráfico e consumo de drogas, trafico de pessoas e rapto, um caso que, aqui em Cabo Verde é muito frequente. Pelo facto de serem menores, inocentes e inofensivos, as crianças tornam-se rapidamente numa presa fácil nas mãos do predador. Esta é uma dura realidade vivia por Jailson, rapaz de 13 anos. O menino conta que:  "Eu estudo de manhã, saio da escola venho para cá trabalhar, aqui comecei com 9 anos  com o dinheiro que ganho ajudo também em casa. se eu ficar em casa não tem o que comer à noite.  Depois umas sete horas eu vou para casa. Na rua já passaram muitas dificuldades como discriminação, assaltos, etc…”.

   Esta questão político-social precisa ser analisada com uma atenção especial. “Existe o ICCA que combate e muito bem este flagelo” realça o Sociólogo. Há uma lei que diz que uma criança não deve trabalhar. Tem direito ao ensino primário e secundário. Também existem as convenções Internacionais.
    O fenómeno “Crianças na rua” é um fator extremamente preocupante. Há todo um esforço que se deve fazer para garantir a segurança, a felicidade e o bem-estar dos pequeninos. No entanto, as ONGs, o Governo, a Sociedade junto com a estrutura familiar devem unir no combate ao flagelo. A família, em primeiro lugar, deve estar sempre junto das crianças porque a educação provém primeiro do lar. A escola como sendo um lugar de convivência tem uma quota-parte. É onde os miúdos devem sentir o prazer, o gosto de lá estarem. Por último, os educadores e encarregados de educação têm que “controlar” as crianças.

 De facto, a rua não é um local para as crianças aprenderem a ter um bom conhecimento da ética e moral para um bom convívio. Se os Pais não tiverem tempo para educar os miúdos, a sociedade tampouco importara com isso. A educação vem de berço, e quando assim não for, as ruas darão uma outra faceta aos meninos. Este aspeto pouco conveniente pode provocar o futuro das nossas crianças e consequentemente do nosso Cabo Verde de Amanhã. 


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